terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Os verdadeiros participantes do Big Brother


No paredão entre Ronaldo e Fabiana, Pedro Bial soltou em meio às suas filosofia uma declaração que considero a melhor definição do que é Big Brother Brasil:

“Este programa é tanto que ainda suscita mais que espectadores. Espectadores assíduos, divididos entre a favor e contra, acreditem, na 12ª edição! Contra ou a favor não deixam de assistir, como se fosse guerra fria, como se não fosse um programa de televisão. E é verdade. Não é só um programa de televisão. É um espetáculo de natureza humana que, ao contrário do que rumina o senso comum, sem dúvida revela muito mais sobre a natureza de quem espia do que de quem é espiado. Revela muito mais sobre quem vê do que sobre vocês que estão aí para ser vistos.”


Não acredita? Eu explico. Uma matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, no dia 22 de janeiro, trouxe um caso interessante. Em 2007 na África do Sul, um caso de estupro garantiu uma mancha negra na história do Big Brother no país. Richard Bezuidenhout, 24 anos, foi acusado de estuprar com os dedos uma colega de confinamento. A enfermeira Ofunneka Molokwu, 29 anos, estava desacordada em coma alcoólico, quando Richard se aproximou. Em meios a pedidos dos próprios participantes do programa para parar com a agressão, Richard não se intimidou e justificou a violência: “Estamos na África do Sul”. Ao fim do programa, Richard Bezuidenhout se consagrou campeão do Big Brother África.
A quem podemos atribuir a culpa por essa atrocidade? Ao programa que incita a violência, o uso de álcool e o pior das pessoas, ou a sociedade que assiste e compra o conteúdo e que, ao fim, consagra vencedores?

Para entender o que houve no programa é preciso entender em que contexto histórico o país se situa. A África do Sul tem provavelmente a maior incidência de estupros no mundo. Mais de 50 mil casos são reportados à polícia todos os anos. Para uma em cada três mulheres na África do Sul, a primeira experiência sexual é involuntária. O país possui também os chamados “estupros corretivos”. Eles são aplicados em mulheres homossexuais como uma forma de recuperá-las da anormalidade. Acredita-se que mais de dez homossexuais mulheres são estupradas - por indivíduos ou coletivamente - por semana apenas na Cidade do Cabo, segundo a Luleki Sizwe, uma organização de apoio a vítimas de violência sexual.

O Big Brother Brasil é considerado a melhor versão do programa em todo o mundo. É sucesso de audiência mesmo em sua décima segunda edição, simplesmente porque os brasileiros se identificam com os participantes e situações e votam de acordo com seus valores culturais.

Em 2002, o BBB deixou de ser “publicamente” virgem e testemunhou uma cena de sexo entre os participantes Jeferson e Tarciana. O caso foi extremamente criticado e os protagonistas da cena perderam completamente a simpatia do público. Por esse motivo a Globo nunca mais mostrou uma cena de sexo entre os participantes. Em 2010, ano da diversidade sexual no BBB, a tribo dos coloridos agitou as coisas dentro e fora de casa. O caso Dourado tomou conta do Brasil e mobilizou em peso as redes sociais. Por causa do programa, ondas de ataques homofóbicos se colidiram com protestos a favor da diversidade em todo o país. Mesmo o Brasil tendo a cidade do Rio de Janeiro considerada melhor destino gay do mundo, Dourado foi consagrado campeão da edição.

É inegável que quem faz o programa são os telespectadores. A delícia de querer participar do reality show, mesmo que do lado de fora, é a possibilidade de poder julgar o outro. BBB é constituído de julgamentos. E ao julgar, o público acaba por revelar seus valores, seus medos e seus preconceitos, os mesmo que regem as relações sociais que vivenciamos diariamente. Chamar o programa de baixo e sem conteúdo é uma forma fracassada de tentar se isentar de um retrato social vivido por todos brasileiros. Esse texto não é uma defesa ao programa, mas sim uma tentativa de combate a negação daquilo que vivemos. Nós brasileiros não somos uma simples manifestação de um programa popular, mas sim a obra prima que permite o programa existir.


4 comentários:

  1. A princípio, nós temos uma ligação muito forte com tudo que não entendemos. Gostamos de experimentar, descobrir e conhecer. Nós, enquanto seres humanos, não nos conhecemos como gostaríamos... a oportunidade de enjaular e observar alguns indivíduos é tão única e especial que motiva esse amor que se repete pela sua 12a edição.
    Mas a pergunta é simples: oq realmente aprendemos com isso? Acho que nada. Parei de assistir o programa em 2008, ou 2009, quando as responsabilidades cresceram e faltou tempo para dedicar-se a uma novela de 90 episódios diários. mas ao mesmo tempo, não julgo quem gosta, assiste, se emociona e participa. Cada um prioriza como bem entende seu tempo... e também não acho que seja ignorância assistir o Big Brother. Ignorância é acreditar que você já sabe tudo sobre a vida e não tem nada a aprender - nem que seja com os erros, acertos, defeitos e qualidades do outro.

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  2. Nossa, mas um texte INCRIVELMENTE bem escrito por você. Parabens.

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  3. Fiquei estarrecido com essa do BBB da África do Sul. Não sabia desse altíssimo índice de estupros (principalmente o das lésbicas) e nem da vitória desse cara. Achei absurdo, surreal. Quanto a assistir, vi todas as edições e acho que o Brasil (que pelo menos em tese é quem escolhe os vencedores) já conseguiu se mostrar tão justo quanto absolutamente injusto e sem razão nas suas decições de quem merecia ser um milionário. Já quis ser um milionário de BBB e até cheguei a ser chamado para um teste mas não "fiz o requisito" no momento em que disse que jamais protagonizaria uma cena de sexo lá dentro - fui eliminado! Hoje continuo correndo atras do meu primeiro milhão mas acho (acho) que jamais toparia o risco de ser eternamente um ex-bbb-subcelebridade-xoxado-por-todos. Vou continuar assistindo e só!

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  4. Gente, minha delícia tem blog e eu não sabia! Que absurdo! ^v^

    BB é polêmico, não importa em qual país. Mas acho que é aquilo mesmo que vc disse, chuchu. Bem ou mal, acaba sendo um retrato do que a nossa sociedade julga (in)justo. Pois somos "nós" que decidimos quem é o vencedor. #medo

    Adorei. Seus textos estão ótimos. Vou assinar o feed nesse momento!

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